A decisão do governo federal de transferir a Cinemateca da cidade de São Paulo para Brasília é criticada por senadores como Humberto Costa (PT-PE) e Major Olimpio (PSL-SP), mas tem o apoio do senador Izalci Lucas (PSDB-DF). A Cinemateca um dos maiores acervos sobre a área da América do Sul, formado por cerca de 250 mil rolos de filmes e mais de um milhão de documentos relacionados ao cinema, como fotos, roteiros, cartazes e livros, entre outros.
Para Humberto Costa, a decisão de transferir a Cinemateca para Brasília é mais um equívoco do governo de Jair Bolsonaro, que, assim, demonstra seu total descaso com a cultura brasileira, especialmente com a produção e a preservação do audiovisual nacional. O senador fez essa avaliação na segunda-feira (27), ao comentar a decisão de transferir para Brasília
— Para quem conhece a Cinemateca em São Paulo, a decisão de fazer a transferência para Brasília me parece ser algo profundamente equivocado. Em primeiro lugar, porque aquele local já se configurou como espaço importante do cinema brasileiro e, para isso, detém uma estrutura inteiramente adequada e adaptada para a preservação de um acervo que exige um cuidado especial, inclusive do ponto de vista da segurança contra incêndio e acidentes. Além do mais, lá funciona a sede regional do Ministério da Cultura, o que torna aquele ambiente uma estrutura viva — afirmou Humberto Costa.
A crise atual na Cinemateca teve início após o encerramento do contrato de gestão com a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp). O contrato foi assinado em 2018, entre o antigo Ministério da Cultura e o Ministério da Educação, e deveria durar até 2021. De acordo com o contrato, a Cinemateca passaria a ser administrada integralmente pela Acerp. Em dezembro de 2019, o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, não quis renovar o acordo que validava o vínculo com a Cinemateca até março de 2021. Desde então, a Cinemateca não recebe recursos da União e acumula dívida em torno de R$ 13 milhões.
O procurador Gustavo Torres Soares, do Ministério Público Federal, é autor de petição que cobra a União para que sejam viabilizadas a gestão e a preservação da Cinemateca. Ele adverte que as salvaguardas que impedem a manobra do governo estão previstas em contrato de 1984, quando a então fundação privada foi doada para o governo federal.
Cultura em risco
A decisão de transferir a Cinemateca também é criticada pelo senador Major Olimpio (PSL-SP). Para ele, a transferência da instituição de São Paulo para Brasília põe em risco uma parte da cultura brasileira.
— A Cinemateca de São Paulo está respirando por aparelhos. É o maior acervo de cinema do Brasil, que traz a história da cultura. Tem lá o acervo da Tupi, da Vera Cruz, da Carmem Miranda, do Vigilante Rodoviário, cerca de duzentos e cinquenta mil filmes, a história do nosso país — afirmou.
Major Olimpio lamentou ainda que a Cinemateca venha sendo prejudicada em razão de aspectos ideológicos.
— Por um chamamento público, desde 2018, quem administra a Cinemateca é a Fundação Roquette Pinto. Mas, por perseguições de caráter ideológico da cultura, o ex-ministro Abraham Weintraub simplesmente paralisou os pagamentos, um absurdo total. Nós vamos reagir — declarou.
Iniciativa privada
Já o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) aponta vantagens na transferência da Cinemateca para Brasília. Em sua conta do Twitter, Izalci apontou os benefícios da mudança da instituição para a capital federal.
“A Cinemateca seria bem-vinda na capital do país. A instituição guarda documentos, fotos, rolos de filmes da produção audiovisual no Brasil. Acredito que a iniciativa privada poderia ajudar tanto na mudança como na manutenção do espaço”, publicou ele.
Em entrevista à revista Veja, Izalci Lucas disse ter sido escalado pelo governo para encontrar um local para abrigar a Cinemateca em Brasília.
“Temos o CCBB [Centro Cultural do Banco do Brasil], por exemplo, e outras opções de lugares dentro do patrimônio público da União”, disse o senador.
Histórico
A Cinemateca teve origem em 1940, quando Paulo Emílio Sales Gomes, Décio de Almeida Prado e Antonio Candido de Mello e Souza, entre outros intelectuais, fundam o Primeiro Clube de Cinema de São Paulo, que se propõe a estudar o cinema como arte independente por meio de projeções, conferências, debates e publicações.
Em 1984, a Fundação Cinemateca Brasileira é extinta e incorporada, como órgão autônomo, à Fundação Nacional Pró-Memória. Em 1988, o prefeito Jânio Quadros cede à instituição o espaço do antigo matadouro da cidade. Após nove anos de reformas, a sede da Cinemateca Brasileira é definitivamente instalada na Vila Clementino. Os edifícios históricos depois são tombados pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) e pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp).
Em 2003, a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura incorpora a Cinemateca Brasileira. De 2008 a 2013, as atividades de preservação e difusão de acervos da Cinemateca Brasileira ganham impulso graças a recursos investidos pelo antigo Ministério da Cultura, em parceria com a Sociedade Amigos da Cinemateca. Em 2016, ocorreu o quarto incêndio na Cinemateca, que resultou na perda de 1.003 rolos de filmes em nitrato de celulose, referentes a 731 títulos.
Em 2016, o antigo Ministério da Cultura, por meio de sua Secretaria do Audiovisual, assina contrato com a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), organização social qualificada pelo Ministério da Educação, para execução de um projeto de preservação e acesso de acervos audiovisuais, da Cinemateca Brasileira.
Em 2018, foi assinado o contrato de gestão entre o antigo Ministério da Cultura e o Ministério da Educação para administração integral da Cinemateca pela Acerp, que deveria durar até 2021.
Agência Senado.
Imagem: Pedro Gomes.
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