O Rio de Janeiro é o estado com o maior registro de candidaturas de militares para as eleições de outubro deste ano. Um levantamento da organização não-governamental Iniciativa Direito a Memória e Justiça Racial (IDMJR) por meio do Projeto de Olho na Assembleia Legislativa do estado (Alerj), mostra que o Rio tem 212 das 1.517 candidaturas militares registradas em todo o Brasil.
O aumento de militares postulantes a vagas nos Poderes Executivo e Legislativo, em território nacional, em relação às eleições de 2018, quando os mesmos cargos estavam em disputa, foi de 27,9%. Segundo trecho do documento do IDMJR, “assistimos a uma ampliação da militarização e milicialização da política institucional, por conseguinte, um fortalecimento da popularmente conhecida Bancada da Bala, que atua principalmente no debate de segurança pública”.
O crescimento da entrada de militares na política estadual já havia sido sentido na eleição passada. O Projeto de Olho na Alerj, que monitora as proposições legislativas sobre segurança pública no Parlamento fluminense, identificou que a atual legislatura (2018 – 2022) registrou aumento
de 85% na composição de deputados estaduais do Rio oriundos dos setores militares.
Na sequência, aparecem São Paulo, com 187 candidatos e candidatas, e Minas Gerais, com 94 candidaturas, justamente os estados da região Sudeste com os maiores colégios eleitorais. O dossiê ressalta, ainda, que a maior parte dessas candidaturas são do gênero masculino.
Em relação ao cargo postulado por esses candidatos militares, 63,4% buscam ocupar as cadeiras de deputados estaduais, 33,8% deputados
federais e 0,9% Senado.
“Militar para chamar de seu”
Coordenadora do IDMJR, a economista Giselle Florentino lembra que não há ineditismo em relação a militares no poder na história do Brasil. Mas ela afirma que, no contexto atual e junto com outros ingredientes, o resultado pode ser uma bomba-relógio.
“São candidaturas de um campo militarizado em associação com a conjuntura conservadora, neoliberal, de crise mundial do capitalismo que nos fazem sentir os efeitos de empobrecimento no Sul global. Assistimos a militares adentrando os parlamentos, e esse é um processo muito sério de riscos, representa riscos à democracia”, avalia a coordenadora da ONG.
A economista faz críticas à entrada dessa parcela social tanto em partidos de direita quanto nos de esquerda. Segundo ela, há partidos da esquerda também empenhados em ter “um policial para chamar de seu”. Ela aponta a priorização de determinadas pautas e as consequências do militarismo em instituições políticas no estado.
“Quando vamos analisar a produção legislativa dessa bancada da bala, há uma tendência de propostas de expansão desse policiamento ostensivo nas suas respectivas áreas eleitorais, com cada um também criando seu Segurança Presente [programa público-privado de policiamento do governo do Rio] para chamar de seu, alteração desenfreada de proposição de planos de carreiras e aumentos arbitrários de benefícios sociais como se eles fossem uma casta especial em relação aos demais servidores públicos”, enumera.
Ainda assim, é a direita quem lidera as indicações de militares no Rio de Janeiro. O partido Agir, conhecido até 2021 como Partido Trabalhista Cristão (PTC), tem 21 candidatos, seguido pelo PTB (19), PRTB (19), Patriota (16), PMN (15), PMB (14), Podemos e Republicanos (11 cada um), PSC (10), Pros, DC e União (9 cada um), PP e PL (8 cada um), Avante (7), PSD (5), MDB e PSDB (3 cada um) e Cidadania (2).
No campo da esquerda, o Partido do Trabalhadores (PT) do estado não possui candidato que tenha se declarado militar, segundo o levantamento. Já o PDT tem dois candidatos, seguido pelo PSB, Psol e Rede, cada uma das legendas com um candidato associado à polícia militar (42,7% do total), militares reformados (32,4%), bombeiros (10%), forças armadas (8%) e outros (6,9%).
Contrapesos
Em entrevista ao Brasil de Fato, o professor Marcus Ianoni, cientista político da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirmou que a anunciada “nova política” das eleições passadas trouxe flagrante e aberta manifestação de hoje políticos que defendem o fechamento do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e que conspiram, novamente, com o “financiamento de empresários pelo neofascismo”.
“São pessoas com vínculo com a milícia, como considera-se que seja o clã Bolsonaro, e com viés neofascista, que se caracteriza por criar mobilizações de massas para buscar legitimidade para ações violentas de eliminação do inimigo, é um tipo especial de autoritarismo. Vimos a morte do dirigente do PT, em Maringá, mesmo antes do início da campanha eleitoral”, pontua Ianoni.
No cenário atual de pesquisas de intenção de voto e a pouco mais de um mês do primeiro turno das eleições, o cientista político afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem sido o contrapeso viável, na esfera do Poder Executivo, e a maior ameaça à continuidade do bolsonarismo, ao menos pela via da reeleição de Jair Bolsonaro (PL).
“Não sabemos ainda se o bolsonarismo é uma onda passageira ou se ele vai prosseguir. É possível que haja, sim, novos bolsonaros querendo ocupar o lugar do Bolsonaro quando ele sair. Então, é uma questão dessas forças progressistas lutarem por democracia e por justiça social e fazerem frente também no Congresso Nacional ao avanço desse autoritarismo e do aparato repressivo”, afirma ele.
Reportagem de Eduardo Miranda, da Brasil de Fato RJ.
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