Uma parceria que começou (formalmente) em 2018 e supostamente tinha terminado em 2020 (com direito a agressões de parte a parte) voltou aos bons momentos às vésperas das eleições de 2022. O “casamento” entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o agora senador eleito Sergio Moro (União Brasil) ganhou novos capítulos que fizeram corar alguns lavajatistas no debate da Band no último domingo (16).
A cena de Moro como “papagaio de pirata” do atual presidente foi uma das mais marcantes do primeiro encontro entre os presidenciáveis às portas do segundo turno. O ex-juiz, ex-ministro e ex-pré-candidato à presidência agia de modo completamente incoerente com tudo o que disse nos últimos anos.
Ao deixar o “superministério” da Justiça e da Segurança Pública em 2020, Moro alegou “interferência política” do presidente junto à Polícia Federal. Foi o suposto último momento de uma relação em que o ex-juiz foi quase sempre desautorizado pelo então chefe.
Ao aceitar o cargo após ter tirado Luiz Inácio Lula da Silva (PT) da disputa em 2018, Moro já dava mostras do que viria. Ele negou, por exemplo, ter tomado “decisão política” – mesmo tomando assento em uma cadeira diretamente ligada à do presidente, tendo sido indicado por ele.
Por parte de Bolsonaro, o rompimento de outrora também foi barulhento e cheio de acusações. O presidente chegou a dizer que o então desafeto barganhou vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) enquanto ainda era ministro.
Depois de deixar a Esplanada dos Ministérios, Moro, que em entrevista ao Estadão em 2016 havia dito que jamais entraria para a política, iniciou pré-campanha à presidência. Mesmo quando esteve nos Estados Unidos, em uma mal explicada atuação como consultor, não deixou que seu nome fugisse do radar de parte da imprensa, que via nele uma esperança para a tal “terceira via”.
Amparado pela ideia de uma popularidade que provavelmente nunca teve, Moro então tentou se mostrar como uma alternativa “de centro” – seja lá o que “centro” signifique para ele, um ex-integrante de um governo de extrema-direita – contra a “polarização” entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Bolsonaro.
Ele primeiro foi filiado ao Podemos, do então aliado (e hoje desafeto?) Alvaro Dias. Em mais uma amostra de sua questionável habilidade política, deixou o partido para se filiar ao União Brasil, ainda mantendo o sonho de se candidatar ao Planalto.
Enquanto ainda sonhava, fez questão de se afastar de Bolsonaro (sim, o mesmo Bolsonaro que o convidou para o debate do último domingo). Em sua página no Twitter, procurou se apresentar como uma figura diferente. Registros de ataques ao atual ocupante do Planalto continuam na internet.
A candidatura jamais decolou e Moro teve de desistir de concorrer à presidência, dizendo que não desistiu. De toda forma, o próprio União Brasil fez questão de colocar uma pedra em cima da aventura presidencial do ex-juiz e ex-ministro.
Nesse meio-tempo, ele teve ainda de lidar com a rejeição da mudança de domicílio eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) decidiu que, se quisesse se candidatar, Moro teria de se lançar pelo Paraná (isso, no fim, pode ter sido positivo para o agora senador eleito, já que ele conquistou a cadeira que por três mandatos consecutivos foi de Alvaro Dias).
A candidatura ao Senado demorou a engrenar. Em busca do voto bolsonarista dos conterrâneos paranaenses, Moro começou a ensaiar uma reaproximação com o atual presidente algumas semanas antes da votação que o elegeria.
Bolsonaro, que em um primeiro momento foi reticente, decidiu aceitar o apoio do ex-aliado e então desafeto, a quem chegou a chamar de “idiota”. Usando suas habituais metáforas pouco criativas, afirmou a jornalistas, ao fim do debate: “Você nunca brigou em casa com o marido? Uma briguinha. Acontece, divergências, mas nossas convergências são muito maiores”.
Sem poder de determinar a prisão do ex-presidente Lula, a exemplo do que fez antes do pleito de 2018, Moro tenta agora trabalhar ao lado de Bolsonaro de outra maneira. Não estão claros seus reais objetivos e aspirações. Entretanto, a companhia ao presidente no debate foi (mais) um balde de água fria na cabeça de alguns dos mais empolgados lavajatistas de outrora, como os jornalistas Merval Pereira e Mario Sabino.
Reportagem de Felipe Mendes, da Brasil de Fato.
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