Um slide utilizado pela Secretaria do Estado da Educação do Paraná (SEED) para professores utilizarem em sala de aula diz explica que as vítimas da ditadura eram “antipatriotas” e “esquerdistas”. A APP Sindicato, que representa os professores, denunciou o fato em suas redes sociais e à entidades de defesa dos direitos humanos.
Na foto da tela recebida pela APP, é possível verificar múltiplos usuários visualizando a apresentação. A secretária educacional da APP-Sindicato, Vanda Santana, classificou a situação como extremamente preocupante, pois o texto reproduz o posicionamento político ideológico de quem elaborou um material que é disponibilizado para todos os professores da rede estadual.
A dirigente critica o modelo adotado pela educação paranaense para a produção de materiais didáticos, pois o método possibilita que a opinião de um indivíduo vire referência no ensino. “Por isso nós temos reforçado constantemente a importância da autonomia no trabalho docente, desde o seu planejamento, produção de material e o encaminhamento das aulas”, comenta.
A denúncia do material circulou em grupos de mensagem na última sexta-feira (1º). Horas depois, o conteúdo foi alterado. Na nova redação, os alvos da ditadura são retratados como “opositores e pessoas consideradas subversivas à ordem estabelecida”. Para Vanda, a modificação do texto continua problemática, pois mantém o viés ideológico de defesa de um Estado governado por regimes autoritários, sem democracia, e de criminalizar qualquer espectro político diferente dos partidos conservadores.
Autoridades e lideranças dos direitos humanos pedem apuração
Para a presidenta do Conselho dos Direitos Humanos do Paraná (Copedh), Bruna Ravena Braga, o fato precisa ser apurado para que providências sejam tomadas. “Isso é gravíssimo. Vamos nos inteirar do caso, solicitar que o material seja retirado das grades, que seja responsabilizado quem aprovou este material e também encaminhar para os órgão competentes”, diz.
Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Paraná, o deputado Professor Lemos, o texto em questão presta um desserviço aos estudantes. “É uma afirmação falsa. Tem um viés ideológico que não retrata a verdade que foi a ditadura. Um regime autoritário, antidemocrático que perseguiu e criminalizou qualquer espectro político diferente dos conservadores. É por isso que defendemos o conhecimento científico, a pesquisa científica, além da autonomia do docente, o planejamento e produção de material das aulas”, afirmou.
Além da gravidade dos fatos, a assessora jurídica na ONG Terra de Direitos e conselheira do Copedh, Daisy Ribeiro, vê no texto denunciado uma completa distorção do que foi a ditadura militar, um período marcado por graves violações de direitos humanos.
“A associação de que aqueles que repudiavam a repressão seriam antipatriotas foi inclusive a narrativa falaciosa utilizada pelo regime à época. É descabido que isso apareça em material escolar fornecido pelo Estado. Estamos aguardando as informações completas para avaliar todos os fatos e solicitar as providências cabíveis,” diz.
Não é a primeira vez
Não se trata de um caso isolado ou a primeira ocorrência. Em fevereiro deste ano, a APP denunciou outro material ofertado pela Seed com enfoque inadequado. O conteúdo distribuído para as aulas de Educação Financeira trazia slides estigmatizando a pobreza e culpabilizando estudantes pela sua condição social.
Para o professor aposentado, Luis Claudio Pereira, que lecionou a disciplina de História por mais de 32 anos nas redes pública e privada, o ocorrido é inaceitável e deixa evidente a ideologização bolsonarista que tomou conta da educação pública paranaense sob a gestão de Ratinho Jr. e Renato Feder.
“É assustador. O governo cria uma narrativa justificando um posicionamento ideológico da direita. Isso é nocivo para a democracia e nos afasta de uma visão de mundo pautada nos direitos humanos”, diz.
Em nota para o Brasil de Fato Paraná, a chefe de departamento curricular da SEED. Ane Carolina Chimanski, informou que o conteúdo do slide foi modificado. “Os materiais didáticos são produzidos pelos professores da rede estadual atuantes na Secretaria de Estado da Educação do Paraná (Seed-PR). Os conteúdos são utilizados como apoio pedagógico (assim como os livros didáticos), para o desenvolvimento das aulas, não sendo seu uso obrigatório. Todo o material disponibilizado é editável e seu conteúdo (desde eventuais erros gramaticais ao uso de termos específicos) pode ser alterado pelos próprios docentes. O conteúdo da apresentação da aula do componente curricular de Geografia foi devidamente comunicado e imediatamente modificado.”
Reportagem de Brasil de Fato PR, com edição de Ana Carolina Caldas.
Comentar